sexta-feira, 30 de março de 2012

Os chimpanzés e a análise gráfica, uma crítica!


Os chimpanzés e a análise gráfica, uma crítica !

O crescimento do mercado de capitais brasileiro também provocou um aumento substancial do uso da analise gráfica, graças às facilidades da internet e, em geral, entre os investidores individuais novatos. Os proponentes do método gráfico de análise gostam de denominá-lo de análise técnica, provavelmente para dar um ar de cientificidade, que ele não tem. Ou seja, o nome já é um embuste.

O grafista tenta prever o movimento do preço da ação através das formas do gráfico, olhando pelo retrovisor os preços e volumes históricos. Sozinho, preço não quer dizer nada, é preciso compará-lo com alguma estimativa de valor para fazer sentido em termos de investimento. Warren Buffett diz que: "preço é o que você paga, mas valor é o que você recebe". Ou seja, o grafista compra um pedaço de papel, mas não sabe o que está recebendo. Seth Klarman comenta no seu livro "Margin of Safety", que isso se parece com aquela estória em que "traders" negociavam latas de sardinhas. Até que, um dia, um deles resolveu abrir uma lata e viu que ela estava estragada, e comentou: "Mas essas latas não valem nada!", e um colega respondeu: "Você não entendeu, essas latas são para 'trade' e não para serem consumidas".

David Dreman, CIO da Dreman Value Management, pioneiro no uso das finanças comportamentais, cita no seu livro "Contrarian Investment Strategies" um famoso grafista, Joe Granville que diz: "Enquanto os indicadores podem ser claros como cristais em definição e teoria, eles freqüentemente deixam de funcionar e transmitem sinais falsos". Por isso, a análise gráfica requer um alto grau de capacidade de interpretação por parte do analista. E cada grafista tem seus indicadores preferidos, o que freqüentemente provoca divergências entre eles a respeito das conclusões.

Um aspecto crucial para o uso da análise gráfica é que o ativo seja bastante líquido, caso contrario a analise gráfica fica inoperante, pois não há dados suficientes para interpretação. Ou seja, a analise gráfica não é utilizada em uma das áreas mais atrativas em termos de investimentos, que são aquelas em que a liquidez é baixa, e as empresas não têm cobertura de analise do "sell side". Em resumo, onde há boas possibilidades de existirem ativos subavaliados. O mesmo não acontece com a analise fundamentalista.

Ben Graham menciona no seu livro "O investidor Inteligente" que: "O único principio que se aplica às abordagens gráficas de análise é que se deve comprar porque uma ação ou mercado subiu e deve-se vender porque começou a baixar. Isso é exatamente o oposto daquilo que funciona em outras atividades empresariais e dificilmente levará ao sucesso duradouro em Wall Street".

Em 1995, Alan "Ace" Greenberg, que foi "trader" e depois CEO/presidente da Bear Stearns e autor do livro "Memos from the Chairman", enviou um memorando com o texto abaixo quando quiseram contratar um analista gráfico:

"Certo numero de pessoas de vendas, de todas as áreas, tem solicitado a contratação de um grafista. Eu descobri alguém, que eu penso que vai satisfazer todo mundo, inclusive àqueles encarregados do nosso programa de austeridade de longo-prazo. Esta pessoa trabalhará literalmente por amendoins."

"Tudo o que nós precisamos fornecer para ele são lápis e papel, e Doodles Danenberg fará seu trabalho. E nós distribuiremos seus gráficos, os quais eu prometo, serão tão bons como qualquer outra analise gráfica efetuada em Wall Street."

"Doodles não trabalhará na sede (245, Park Avenue), mas estará disponível para consultas pessoais, caso vocês queiram. O escritório dele fica a alguns quarteirões daqui. Ele é um chimpanzé, residindo no Zoológico do Central Park. Eu estou certo que todos vocês desejam boa sorte para o Doodles."

Brian McNiven conta no seu livro 'Market Wise' a historia de um amigo: "Ele começou sua carreira como analista gráfico, mas observou a futilidade de antecipar a direção da tendência dos preços das ações quando ele percebeu que metade do seu relatório mensal era dedicada a pedir desculpas pelas conclusões errôneas do mês anterior. Esse amigo é agora um dedicado investidor focado em valor e que administra seu próprio fundo".

O surpreendente é que os luminares da análise gráfica não produzem estudos científicos e nem trabalhos mais simplificados mostrando o desempenho do método por um longo período de tempo. Caso existisse, seria interessante ler um artigo com o título: "The Superinvestors of Edwards & Mageesville". Esses são os sobrenomes dos autores de um dos principais livros da analise gráfica.(A continuação deste artigo será publicada na edição de 03/12/2007)

Os chimpanzés e a análise gráfica, uma crítica II

Luiz Codorniz
03/12/2007

Warren Buffett escreveu "The Superinvestors of Graham & Doddsville" para contestar os defensores da eficiência do mercado, em que mostra o desempenho de nove gestores por um longo período de tempo e que superaram o índice S&P 500, usando "value investing".

É curioso que nunca vi uma empresa de gestão de fundos de ações, que administre bilhões de dólares, dizer que a sua filosofia de investimento segue as técnicas de análise gráfica desenvolvidas por Robert D. Edwards e John Magee autores de "Technical Analysis of Stock Trends" ou métodos de análise gráfica inventados por outros luminares. Entretanto, os proponentes da análise gráfica apregoam que ela dá excelentes resultados. Faço as seguintes perguntas: Quais são as gestoras de fundos de ações que utilizam somente esse enfoque? Volume de recursos administrados ?

Por outro lado, existem muitas gestoras de fundos de ações e de "hedge funds" que mencionam que sua filosofia e enfoque de análise de investimento derivam das idéias desenvolvidas e publicadas por Benjamin Graham nos livros "O Investidor Inteligente" e "Security Analysis". Além disso, os retornos obtidos por essas gestoras são públicos para o escrutínio dos investidores. Alguns exemplos de gestoras: Brandes Investment Partners, que administra cerca de US bilhões; Davis Funds (US bilhões); Oakmark Funds/Harris Associates (US bilhões); Longleaf Partners (US bilhões); First Eagle Funds (US bilhões); Gabelli Funds (US bilhões); Ruane, Cunniff & Goldfarb / Sequóia Fund (US bilhões); Tweedy Browne (US bilhões). Elas utilizam "value investing" desde a sua fundação, há mais de 30 anos.

Louis Lowenstein, no artigo "Searching for Rational Investors in a Perfect Storm", analisa os resultados obtidos por dez fundos de ações que utilizam o enfoque de "value investing", nos anos turbulentos de "boom-crash-rebound" (alta, quebra e recuperação), de 1999-2003, ou seja, um período de cinco anos. Todos eles superaram o S&P500, agregadamente em 10,8% ao ano. Qual foi o desempenho, nesse mesmo período, dos fundos de ações geridos com base na análise gráfica?

Martin Fridson autor de "Investment Illusions" diz que: "a única coisa que sabemos com certeza sobre a análise gráfica é que é possível ganhar a vida publicando uma 'newsletter' sobre o assunto". E, adicionalmente, ministrar cursos e escrever livros.

A essa altura o leitor deve estar se perguntando porque esse método, apesar dos seus problemas, como a falta de comprovação científica dos resultados, é ainda amplamente usado e promovido? Aqui vão algumas razões:

1) atende a nossa necessidade psicológica de gratificação instantânea, ou seja, usa-se muito nos "trades" de curto prazo; 2) "hindsight bias", um viés identificado pelas finanças comportamentais, no qual os eventos parecem ser mais previsíveis após o fato do que antes de acontecer, e isso gera confiança (erroneamente) para no futuro fazer outras previsões; 3) as corretoras adoram o método e o promovem, pois faz com que a clientela faça um maior número de transações, que significa mais ganhos com corretagem; 4) Jason Zweig comenta em "Your Money & Your Brain" que o cérebro humano está programado para identificar padrões e efetuar previsões, mesmo nas situações em que os dados são aleatórios, ou seja, mesmo quando não existe um padrão repetitivo. As pessoas detestam aleatoriedade. A compulsão humana de fazer previsões sobre o imprevisível se origina nos centros de dopamina do cérebro reflexivo. E, ele denomina essa tendência de "vício da previsão"; 5) a facilidade do uso da análise gráfica é altamente sedutora, pois só é necessário um computador, base de dados e um software de análise gráfica que agilize a identificação das formações gráficas.

Já o "value investing" requer mais tempo e conhecimentos de contabilidade, finanças etc.; e os resultados, em geral, aparecem no médio e longo prazo, ou seja, requer paciência.

Ressalto que não quero dissuadir ninguém de usar análise gráfica, pois seu uso traz vantagens para os demais participantes do mercado. A existência de divergências de opinião e nos métodos de operação aumentam a liquidez das bolsas. Além disso, Seth Klarman, gestor do hedge fund Baupost Group (US bilhões) e autor do livro "Margin of Safety" diz que: "As melhores oportunidades de investimento surgem quando os outros investidores atuam de maneira insensata e, com isso, propiciam ganhos para aqueles que agem inteligentemente." (Este artigo é a continuação do publicado em 26/11/2007.)

Luiz Codorniz é consultor de Investimentos. Fonte: Valor Econômico

Opinião CEOINVEST:

O texto é muito bom e fornece uma discussão interessante: analistas técnicos e fundamentalistas são como times rivais em um campeonato de futebol em que os extremistas se odeiam. Cada um puxa a sardinha para o lado dele e defende com unhas e dentes suas posições estratégicas. O texto (claramente fundamentalista) quase que destrói os fundamentos gráficos. No entanto, minha longa experiência de mercado diz que a análise técnica é fundamental para trades, especialmente os curtos. Desprezá-la pode ser uma tolice fatal. Mesmo grandes corretoras, operando pelos fundos mencionados, a utilizam para programar seus robos no mercado. Então, este tipo de análise, não pode, jamais, ser desprezada. No mais tem aquele ditado: " uma mentira muito dita, acaba se tornando uma verdade fundamentada". Com a análise técnica pode ser assim: mesmo que não tenha tantos fundamentos, vc tem que segui-la, pois ela mostra o que a maioria dos trades está pensando! E isso é decisivo no mercado! Isso gera lucros!! É claro que limitações existem para aplicá-la, como em ações de baixa liquidez aonde este tipo de análise é totalmente falha, como foi citado. Portanto, não sejamos apenas técnicos ou fundamentalistas extremados: o mercado é, na verdade, um verdadeiro quebra cabeças onde você tem que unir várias peças para chegar a uma paisagem, ou seja, a um panorama e, a partir daí, tomar uma decisão acertada. Como aprendi enquanto médico: Sem diagnóstico não há prognóstico. E, em mercado, as duas análises em conjunto são decisivas para qualquer tomada de decisão!

Bruno Ribeiro Abreu
Autor do livro Bolsa de Valores Guia prático e sócio diretor da CEOINVEST


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